Antes de chegar à redação e alardear “Precisamos fazer uma capa com Thiaguinho”, tive a certeza disso na plateia do Tardezinha Surreal. A ideia de ir ao evento foi do meu irmão, pagodeiro desde criança e fã do cantor desde os tempos de Exaltasamba, grupo que o acolheu há 15 anos. Depois de passarmos as festas de fim de ano ouvindo os hists do moço, fomos conferir ao vivo. Thiaguinho subiria ao palco às 18h e eu já tinha avisado que iria embora, no máximo, às 20h. Nada contra o músico, mas os meus quase 40 anos preferem a combinação TV e ar-condicionado à mistura “sol, praia, biquíni e gandaia” proposta na letra de um dos maiores sucessos do artista. Mas... Quem disse que consegui ir embora? Só saí de lá às 23h porque precisava resgatar a filha na casa da madrinha! Ali me dei conta do fenômeno que o Tardezinha produzia em quem gosta de curtir uma roda de pagode entre amigos e entendi a euforia do meu irmão naqueles primeiros dias de janeiro. Ao reunir um repertório famoso dos anos 90 num clima mais intimista com convidados especiais, Thiaguinho se encontrou. E o público percebeu. No Tardezinha Surreal, uma edição especial do projeto, iniciado há quase dois anos, 12 mil pessoas pagaram entre R$ 120 e R$ 900 para uma roda de samba que mais parecia uma micareta. Na ocasião, o anfitrião recebeu seus ídolos Alexandre Pires e Péricles e cantou por seis horas e 36 minutos: um recorde no palco. Foi emocionante vê-lo admirar o ex-vocalista do Só Pra Contrariar e dividir o microfone com quem o fez sonhar viver o que vive agora.
— Sou grande fã dessa galera que eu cresci ouvindo. Além deles, tem Belo, que estou ouvindo muito, Rodriguinho, Salgadinho... Eu era do tipo que deixava de ir a uma festa de aniversário para ver o Só Pra Contrariar no “Faustão”. Sempre fui viciado em pagode. Já é legal realizar o meu sonho. Poder dividir isso com meus ídolos e saber que eles gostam do que eu faço é especial demais. Porque a verdade é que o que eu faço hoje é uma continuação do que essa turma fez e continua fazendo. Eu me sinto filho da música deles — diz o cantor, menos de 20 dias depois do tal show a que assisti, desta vez no camarim da última edição do Tardezinha no Rio, numa entrevista à Canal Extra.
No som, era realmente Belo que estava tocando. O músico chegou para o nosso papo uma hora antes de subir ao palco, já pronto para mais uma apresentação do projeto que começou por acaso e se tornou um feito na sua vida. Ao acertar sua participação no “SuperStar”, em abril de 2016, Thiaguinho comentou com Rafael Zulu, um dos seus grandes amigos, que a única coisa que o limitaria era não poder marcar shows aos domingos pelo Brasil. O ator, então, sugeriu ao cantor fazer uma roda de pagode no Rio, à tarde, no estilo mais praiano, com músicas antigas.
— Marcamos o primeiro para ver como seria e na sexta música eu gritei do microfone: “Quero isso para a vida. Pode marcar para sempre”. E é isso mesmo. Esse é o melhor trabalho do mundo! Quando eu decidi ser pagodeiro, aos meus 12, 13 anos, desejava realizar o que realizo hoje — comemora ele, que tem entre os seus músicos alguns amigos de infância como Luiz Carlos Mori Junior, o Pulgão, e Gabriel Barriga: — A gente se conheceu moleque!
De la para cá, o Tardezinha cresceu, virou CD, DVD e uma turnê que ganhou o Brasil. Nada mal para o rapaz, que começou a cantar na Igreja Nossa Senhora Aparecida, em Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, onde cresceu. A família Barbosa, aliás, foi formada na Igreja. O avô paterno era ministro da eucaristia e trabalhava na cúria. A avó era da Legião de Maria. Os dois, um assistente de pedreiro e uma lavadeira, moravam numa casa doada por um membro de uma paróquia de Presidente Prudente — onde Thiaguinho chegou a viver quando foi fazer faculdade de Comunicação Social, aos 17 anos. O pai, João, cresceu e estudou na escola da igreja. A mãe, Gloria, cantava lá. Com os pais tão próximos, Thiaguinho e a irmã, Ellen Caroline, três anos mais nova, sempre viveram essa realidade.
— A Igreja não serviu só como religião, ela foi a base da nossa educação. Cresci ajudando, vendendo rifa para levantar a sala da catequese, conseguir ar-condicionado, transformar a capela de madeira para tijolo. Eu fechava os vitrais das janelas, contava dinheiro do ofertório no fim da missa, conferia se as luzes estavam apagadas, sabe? Na segunda-feira, tinha a pastoral familiar; na terça, o grupo de oração; na quarta, tinha outra atividade. Essa vivência ajudou a me formar — conta Thiaguinho, com saudade.
O cantor, que, após participar do “Fama”, virou estrela nacional ao ocupar o lugar de vocalista do Exaltasamba (de onde saiu em 2012 para seguir carreira solo) é tão grato a Nossa Senhora Aparecida que monta um pequeno oratório para ela em cada camarim. Prestes a completar 35 anos, no próximo dia 11, agora ele planeja gravar um CD com músicas religiosas:
— Eu me sinto bem dentro da Igreja. É um lugar meu. Adoro ter amizade com padres, cresci com eles na minha casa. Tenho muita vontade de fazer um disco voltado para isso. Tenho uma devoção forte a Maria — destaca Thiaguinho, que, quando criança, fingia que biscoito era hóstia ao brincar de missa, e queria ser padre: — Total!
A vida pacata da família se refletiu em toda a infância e adolescência do cantor, que estudou a vida inteira num mesmo colégio. Além de ser o melhor aluno (“Sempre estive entre as três maiores notas da escola”), o menino foi eleito várias vezes o melhor companheiro em votação entre os estudantes. Filho do professor de Educação Física, Thiago sempre foi um menino quieto, obediente, do tipo que anda na linha.
— Meu pai era professor, coordenador e diretor da escola, coordenador da igreja, diretor social do clube que a gente frequentava, técnico de futebol do time em que eu queria jogar e secretário de Educação da cidade. Eu não tinha como fazer besteira. Ele era disciplinador total — brinca Thiaguinho, que só saiu da casa dos pais para casar, aos 31 anos: — Se eu não tivesse me casado, estaria morando com eles até hoje!
O olhar do professor Jota Barbosa, que continua trabalhando no mesmo lugar e é uma atração nas reuniões de pais por ser pai do cantor, podia até inibir uma tentativa de rebeldia do rapaz, mas a verdade é que Thiaguinho nasceu para ser bom-moço:
— Sempre fui muito estudioso. Tinha que ser exemplo e eu tinha uma cobrança comigo mesmo porque estudava numa escola particular sem ter condições financeiras de estudar. Meu pai sempre deixou muito claro que eu estava lá porque era filho de professor — diz.
Para horror dos Barbosa, ele decidiu prestar vestibular para Música depois de já ter considerado cursar Odontologia e Fisioterapia:
— Houve resistência. Meus pais apostavam em mim. Eles tinham certeza de que eu seria o primeiro doutorzinho da família. Mas não passei em Música. O teste de aptidão e teoria eram puxados. Eu me desesperei e meu pai também! Não podia ficar um ano fazendo cursinho. Fiz vestibular de novo para Odonto, Fisioterapia e Jornalismo. Passei. Comunicação Social foi o que coube no orçamento — lembra ele, que pretendia ser repórter de esporte: — Perderam um cronista esportivo ou um marqueteiro, mas ganharam um pagodeiro.
Alguém aí está chateado? A plateia do Tardezinha não pareceu nem um pouquinho.
‘Sou filhinho de mamãe e papai’
Juntos há quase sete anos, Thiaguinho e Fernanda Souza fazem o estilo de casal almas gêmeas. Ambos têm uma ligação forte com a Igreja Católica e amam pagode desde criança. O cantor, no entanto, tem os seus defeitinhos no quesito dono de casa. “Não faço nada. Sou bem filhinho de mamãe”. Mas nem um churrasco, Thiago André? E ele responde: “Não, meu pai é quem faz até hoje. Sou filho de mamãe e papai. Fernanda ainda tem que aguentar o fato de eu não conseguir ser feliz de manhã. Ainda mais quando durmo às 4h30m e estou no aeroporto às 7h”. Mas quando o assunto é ter um herdeiro, Thiaguinho se mostra um companheirão: “É a mulher que engravida e, por isso, é ela quem deve decidir. Fernanda está num momento muito bom, bem-sucedida como apresentadora, fazendo turnê no teatro... Estou esperando a hora ideal para ela”.
Estilo que vem de berço
Nada do estereótipo do pagodeiro que só gosta de cerveja de garrafa e pagode. Thiaguinho também curte muito o mundo da moda. É do tipo raro que faz compras, experimenta e pesquisa sobre o assunto. A dedicação e o bom gosto tiveram resultado: ele foi o vencedor da categoria Estilo no Prêmio GQ Brasil Men Of The Year 2017. Há seis anos, o cantor tem a ajuda do stylist Dudu Farias, apresentado a ele por Fernanda Souza, que também adora o universo fashion. Mas ele garante que o estilo é de família. “Meus pais sempre foram vaidosos, cheirosos, estilosos. Eu e Ellen herdamos isso desde criança. Eles nos vestiam sempre com conjuntinhos, tudo combinando, sabe?”, conta o artista, que foi influenciado por seus ídolos: “Raspei o cabelo quando Alexandre Pires raspou. Ainda bem que não tinha idade para usar aqueles ternos, né? A moda mudou, e os pagodeiros acompanharam isso. Sei que influencio muitos meninos e faço questão de estar sempre bem vestido.