Ganhou destaque nas redes sociais esta semana a repercussão da fala do ator Marcello Novaes sobre suas ex-mulheres, elogiando as mães de seus filhos e mostrando que o fim de um casamento não significa a morte do amor e do respeito. Alguns internautas apontaram, no entanto, que o bom relacionamento de Novaes com as ex, Sheila, mãe de seu Diogo, e a atriz Letícia Spiller, mãe de seu caçula Pedro, só era possível pois nenhuma delas praticou alienação parental contra o ator.
Claro que não é só isso, mas, de fato, um ex-casal que vivencia um processo de alienação parental dificilmente conseguirá ter uma relação saudável como a de Marcello e suas ex-esposas. A Síndrome de Alienação Parental (SAP), também conhecida pela sigla em inglês PAS, foi o termo proposto por Richard Gardner [3] em 1985 para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços afetivos com o outro genitor, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor para a criança.
Os casos mais frequentes da Síndrome da Alienação Parental estão associados a situações onde a ruptura da vida conjugal gera, em um dos genitores, uma tendência vingativa muito grande. Quando este não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia um processo de destruição, vingança, desmoralização e descrédito do ex-cônjuge. Neste processo vingativo, o filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionada ao parceiro.
A psicóloga clínica e jurídica Denise Perissini explica que esse processo de desqualificações e desautorizações pode acontecer antes mesmo da separação e, quando o divórcio eclode, a situação já está fora de controle. Qualquer um dos cônjuges pode se tornar o genitor alienante. No entanto, como ainda predomina no Brasil o modelo de guarda unilateral (em que os filhos ficam com o pai ou com mãe e o outro tem direito de visita), e as mães costumam ficar com a prole, o número de mulheres que praticam alienação parental é infinitamente superior ao de homens.
A definição legal da alienação parental
De acordo com a Lei Federal 12.318, que entrou em vigor em 2010, considera-se alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida por um de seus pais, avós ou outra pessoa que detenha a guarda na tentativa de fazer com que o menor não estabeleça vínculos com um de seus genitores. Isso acontece, por exemplo, quando são colocados empecilhos seguidamente para que a criança não veja um dos genitores no dia de visitação, deixa de compartilhar com o ex-cônjuge informações sobre a educação, saúde ou mesmo mudança de endereço da criança, ou ainda difama o pai ou a mãe perante a criança.
O advogado Arnaldo Faria, que há 22 milita na área de Família, explica que a lei registra sete situações que caracterizam a ocorrência da alienação parental, mas há outras. "É muito comum, por exemplo, omitir informações pessoais relevantes sobre a criança, inclusive informações médicas e escolares." Segundo o dr. Faria, a prática vem aumentando e raramente se chega a um acordo. São processos longos e a briga costuma ir até o final.
Também não há distinção de sexo ou classe social entre os alienadores. “A alienação parental não é sexista, ainda que pareça. Também há pais que a praticam”, ressalta Denise Perissini, que, como psicóloga e assistente técnica, costuma assessorar uma das partes. Entre seus clientes, há desde gente que trabalha com material reciclável até pessoas com doutorado na USP. Todo mundo está sujeito.
Como identificar a alienação parental?
O advogado Arnaldo Faria explica que, às vezes, a alienação é praticada por capricho, mas geralmente é motivada por mágoa. “Uma causa muito comum de divórcio e separação é o fato de marido arrumar outra mulher. Normalmente, a esposa fica revoltada com o fato de ser preterida, deixada pra trás, e aflora o sentimento de revolta que acaba provocando a alienação parental”, esclarece.
Quando se vêem com a guarda unilateral e com o encargo de criar o filho, uma vez que neste modelo a responsabilidade do pai se limita a visitar ou ficar com a criança em um fim de semana a cada 15 dias, muitas mães ficam com raiva da situação.
Exatamente por estarem com as crianças, acabam tendo maior dificuldade de reconstruir a vida amorosa. “Ele passou a viver uma vida de solteiro e eu aqui, com todas as responsabilidades. Esse tipo de pensamento faz com que a mulher, num primeiro momento, comece a fazer a cabeça da criança contra o pai”, explica o dr. Faria.
Primeiro é no discurso, depois, na prática. Falar mal do outro para a criança, dizer que o pai não trabalha, que nunca foi um bom companheiro (ou companheira), acusar de ser viciado, de não ajudar, de não ligar, de dar uma miséria de pensão, são alguns argumentos. Em seguida se dificulta o contato com a criança. Inventa-se uma doença na criança, quando mora em apartamento manda o porteiro dizer que não está, programa passeio com o filho para o dia da visita, diz que a criança é muito pequena para dormir com o outro cônjuge, e vai por aí.
Mas pode ficar pior. “Como medida extrema, muitas vezes, parte-se para a acusação de abuso sexual. A pessoa já tentou de tudo para afastar o outro e não dá certo, e lança-se mão desse recurso. Mas acusar de abuso sexual é o extremo, é condenar à cadeia, é estigmatizar como pedófilo, é perder o emprego. Neste momento, quem está envolvido na perícia precisa ligar o ‘desconfiomêtro’, não se pode descontextualizar esse tipo de acusação. Numa situação dessas, dentro de outras tentativas de obstrução das visitas que não tenham dado certo, é necessário tomar muito cuidado. A acusação pode ser leviana”, alerta a psicóloga Denise Perissini.