Ó o gás! Jingle que virou funk deve render no Carnaval. Mas quem ficará com o dinheiro do hit?
27/12/2017 03:11 em MÚSICA

Músico que compôs jingle em 1989 fez novo registro de autoria sem citar DJ que montou funk; vocalista do 'grito' é desconhecido. Compor hit de funk pode render até R$ 8 mil por mês.

Por Rodrigo Ortega, G1

O o gás!". Enquanto o Carnaval se aproxima, cresce a chance de você já ter ouvido o grito do funk feito a partir de um jingle de caminhões de gás. Ouvida milhões de vezes na web (veja um dos vídeos), a música pode ser um dos sucessos da folia de 2017. O hit levou o autor do jingle de 1989, Hélio Ziskind, a fazer novos cadastros no Escritório Central de Arrecadação de Direitos Autorais (Ecad) se identificando como único autor do funk. Mas ele mesmo diz ao G1 que a questão de quem vai receber pelos possíveis direitos ainda não está certa.

Falar do "Funk do gás" parece brincadeira, mas se a piada pegar o pagamento pode ser sério. Veja o exemplo de outro funk que virou meme há alguns anos: "Sou foda" (aquele do "na cama te esculacho") rendeu cerca de R$ 8 mil por mês de direitos autorais para o seu autor e intérprete, o MC Vitin, no auge do sucesso, até 2013. Só que, no caso do "Funk do gás", definir quem criou, gravou e tem direito sobre a faixa não é tão fácil.

Hélio Ziskind, músico de 61 anos, fez o cadastro da faixa "Funk do gás" no dia 6 de fevereiro, se identificando como único autor. Também registrou outras faixas com nomes pelas quais a música ficou conhecida nos últimos meses "Olha o gás", "Ó o gás" e "Óóóh o gaaas". Todas têm apenas seu nome como compositor. Mas entre a composição do jingle por ele em 1989 e a criação do funk como é conhecido no meme atual, muita coisa aconteceu.

 

Veja a 'linha do tempo' do 'Funk do gás':

 

 

 

  • 1989 - Hélio Ziskind compõe o jingle original, usado pela empresa Ultragaz.
  • Década de 90 - O jingle se torna popular, tocado em caminhões de gás por todo o Brasil para anunciar a entrega do produto.
  • Data não definida - Um áudio com um grito de um entregador de gás ("ó o gás!"), sem autoria conhecida, é difundido na internet, especialmente no comunicador instantâneo MSN.
  • Agosto de 2013 - Primeiro registro de um "funk do gás" achado no YouTube. Vídeo com 30 mil views mostra o grito "ó o gás" e trecho do jingle, mas em arranjo diferente do de 2016.
  • Julho de 2014 - Vídeo mostra o DJ holandês Hardwell tocar no festival Tomorrowland 2014 a faixa "Ping pong" (ele balança os braços antes de comandar pulos frenéticos do público).
  • Janeiro de 2016 - Internautas começam a fazer montagens do vídeo de Hardwell, trocando "Ping pong" por músicas como "Baile de favela"- do braço balançando à dança frenética
  • Agosto de 2016 - Alessandro Santos, 19, estudante de Vitória da Conquista (BA), posta nova montagem de funk com o antigo grito "ó o gás" e trecho do jingle de Hélio Ziskind.
  • Novembro de 2016 - Alessandro pega o funk do gás de agosto, faz mais uma brincadeira com o vídeo de Hardwell e posta no grupo de Facebook South American Memes.
  • Janeiro de 2017 - Amigos de Cubatão (SP) postam um vídeo com o funk montado por Alessandro e imitando os braços de Hardwell. O vídeo faz sucesso, é imitado até pela própria Ultragaz, e o "Funk do gás" passa a ser citado como possível hit do Carnaval de 2017.
  • Fevereiro de 2017 - A um mês do Carnaval, o autor do jingle, Hélio, cadastra na base do Ecad a música "Funk do gás" e outros títulos semelhantes, indicando que é o único autor.
  • Quem vai mamar no meme?

     

    Hélio também fez o registro das músicas "Tema Ultragaz" e "Tema musical Ultragaz" no dia 6 de fevereiro. Mas por que estes cadastros não foram feitos em 1989? É que, antes do surgimento do meme e da chance de o "gás" se espalhar por bailes, blocos e até TV e rádio no Carnaval, o compositor nem tinha esperança de ganhar direitos autorais pela execução em caminhões. A explicação: o formato de jingle não gera arrecadação pelo Ecad.

     

    A segunda parte da dança do 'Funk do gás' (Foto: Reprodução / Facebook / Renan Vinícius)

    A entidade só cobra pelo uso e repassa aos autores por formatos considerados artísticos, não comerciais. Mesmo assim, Hélio continua sendo o autor da música original. A criação musical é dele, não da Ultragaz. No entanto, como lidar com a execução pública de uma faixa com algumas notas do jingle, batida de funk, uma introdução com formato inspirado em um meme anterior e um trecho vocal de criação e interpretação desconhecidos?

    "O Hélio tem direito autoral sobre a composição, e podemos considerar que o funk criado pelo Alessandro é só um novo fonograma a partir da sua criação", diz Daniel Campello Queiroz, advogado especialista em direito autoral, diretor da empresa CQRights. Esta interpretação justifica a atitude do compositor de fazer o registro.

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